Helena finalmente se sentia diferente. Talvez agora ela pudesse dizer palavra por palavra o que estava sentindo. Pela primeira vez ela podia se acometer do pecado de dizer a verdade. Levantou-se e parou em frente ao espelho. Encarou a imagem durante alguns segundos. O olhar parecia perfurar a pele e lhe injetar doses quase fatais de realidade. Talvez por isso seus olhos se enchessem de lágrima, involuntariamente. Como quando batemos o dedo mindinho numa quina qualquer e nossos olhos se afogam repentinamente, mas por um instante ínfimo. A gravidade não foi o bastante e a lágrima, relutante, preferiu secar. Era uma lágrima de dor latente. Mas até mesmo a dor pode ser prazerosa às vezes, e até mesmo o prazer poder ser doloroso. Era o caso. Há muito seu prazer doía, como uma ressaca diária acompanhada de uma vontade de colocar para fora tudo de ruim que alguma vez ela pensara ter lhe feito bem. E como era enjoativo aquele negócio... Tentou parar de beber várias vezes.
Agora ela segurava o espelho com firmeza. Era um espelho quadrangular grande, daqueles antigos de pendurar na parede, e possuía algumas marcas deixadas pelo tempo. Às vezes Helena parecia se incomodar consigo mesma; seu próprio olhar instigava, como se ele fizesse uma denúncia gravíssima que ela se recusava a ouvir, mas via. Um olhar capaz de chegar a lugares que para ela sequer existiam. Era uma existência cinza e enquanto não se dissolvia no ar, não deixava de ser um incômodo. Helena existia fosca. Sempre tentando colocar os sentimentos pendurados no varal, separadinhos, como que em categorias, como se existissem um sem o outro. Fazia isso freqüentemente, aproveitava os dias de sol e, quando chovia, colocava-os atrás da geladeira. Mas de nada adiantava.
Ainda se olhava profundamente no espelho quando a campainha tocou. Permanecia inerte há quase dez minutos e a campainha já havia tocado duas vezes. Agora, a terceira vez, ela havia percebido, mas sequer se movera. Só acordou quando sentiu um cheiro de queimado vindo da cozinha: esquecera-se do forno ligado! Já que não adiantou também colocar atrás da geladeira, ela colocou alguns de seus sentimentos para secar no forno e, por uma mera distração, eles queimaram.
Helena se levantou do sofá, foi até a cozinha e desligou o forno. Em seguida foi atender a porta, era um vizinho avisando-a do cheiro de queimado. Resolvido o problema, pegou uma vassoura e varreu todas as suas mentiras para fora. Recolheu-as com uma pequena pá e pôs tudo no lixo seletivo.
Agora sua existência passara de fumaça a perfume, e não carecia, nem excedia -sequer um pingo!- da proporção perfeita para inebriar qualquer um que dela se aproximasse.
6 comentários:
vc é a melhor
Anna Lispector...
heheuheuhu
Espero que a minha proposta de gravar um cd com seus textos qd ambas ficarem famosas ainda esteja de pé...
=***
Quanto vc quer de patrocinio?
Pode escolher a editora q vc ta contratada!
=P
Vei, vc eh foda!
PS:Meu comentario vago e idiota pra um texto fodastico!
¬¬'
q profundo!
Mt bom msm!
o q eu mais gostei, até agora, apesar da singele homenagem!
outro dia peguei um livro de contos da clarisse (Onde estiveste ontem a noite) e foi estranho... eu parei o conto varias vezes, pq tava com preguiça de continuar mas foi o suficiente pra me deixar aguniada com coisas q n sabia explicar!
por isso q vc é emo!!!
vou continuar... tenho q ler o q vc me mandou!
bjao
;D
E não eh que eu apareci?! o.O
Véi! Vc me deixa perdida em meus sentimentos! Isso eh bom ou ruim? Ou as duas coisas? Rs!
Boa menina!
bOm!! (lembra?!)
=*
s2!
Chega de elogiar senão depois vc vai ficar toda se querendo, fora o baile né.
rs
Vou te dar uma foto pra vc fazer uma história pra mim, pode, pooode?
rs
Só num cobra tá?
hehe
Te amo, pimentosa!
:*
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